Alguns dos meus poemas mais marginais. Aliás, esta é a minha verdadeira estética poética, se é que devo me situar em algum dos ismos paranóicos.
Um artesanato digital para os meus amigos guardarem dentro.
Sei que a poesia panfletária diminui a “qualidade” do verso. Dane-se. Nunca foi meu objetivo fazer poesia de presépio.
Boa viagem
nOvO
Enquanto o mundo dorme
Meu sono está desmaiado dentro de mim
E sonha tanto na sua hiper-atividade
Que se esqueceu de vir me buscar
Há várias noites estou na estação
Cochilando e sem destino
Com uma sede adicta e vacilante
Na favela, na falta de miragem
Os meninos se vestem de Lampião
Ou então, seguem os beatos ladrões de suas ofertas
E eu não durmo talvez por isso
Não estou bem da cachola
Tem uma tarja preta no criado-mudo
Louca para exterminar com minhas olheiras
Tento evitar mas preciso dormir esta noite
Estou precisando de uma cama nova
Roupas novas
E uma cara nova na minha fuça
Uma revolução na minha vida
Estou farto de gerúndios e de Palácios
Quero bicho-de-pé pra coçar a noite
E comida defumada em fogão à lenha
Estou farto de porteiro, cartões e virtualidade
De fax, formulários e canetadas
Estou com o saco estourando
No meu peito sinto o peso do meu corpo
Tarja preta na idéia e descanso no coração.
O cinema é uma
rosa desconstituindo-se
por detrás do pingüim.
No congelador uma cena do Rei-Momo
passando fome. Na sala acontece um velório
em que a mulata samba ao lado do morto.
A beata senta com desprendimento no colo do padre.
***
Para:Henrique Lott, Lúcio Rodrigues, Carlos Thaga, Danunzio e Marcos Vilela.
É belo o momento em que Jesus Cristo transformou a água em vinho. Um litro deste foi bebido por Charles Darwin (o épico cientista da evolução). Ele classificou ainda mais o poema de Adão : Eva! Uma macaca tesuda fazendo gente às frestas do sol. O artista é este fogo, a beleza, a magia e o vinho. É a loucura da loucura encarnada. O artista é a poesia vestida de matéria.
--------------------------------------------------------------------------------
· MARCINHO VP
morto
matado
do morro
o empregador de cangaceiro
marcinho vp
mais um lampião
apagado
a casa era de lona
não tinha muro
era um barracão
mas tinha pai, mãe e irmão
a casa não tinha jardim
mas não faltava flor
--------------------------------------------------------------------------------
Dentro grita o solado gasto
A lembrança dos passos que ficaram
O túmulo 61 do cemitério da Barreira do Triunfo
A casa de muitos dos meus
O endereço definitivo da minha linhagem
CHAGA IN-CONCRET
de clamar
de cisão
de pressão
de ferimento
de cifrar
de mente
de caído
JUIZ DE FORA
Princesa de nada
Cidade do dentro
No Morro do Imperador
Um Cristo celular
O rio profanado cor de graúna
Uma cidade linda
nas photografias do passado
Em sua saudosa rua da Direita
* * *
Quando o sabiá na gaiola canta
É só ele o canto não está ali o pássaro
Falta o essencial
A laranjeira, o palco do gorjeio
* * *
A maconha é a ponte da tristeza
Uma camisa de força nos injustiçados
O barato alienante do esquecimento
Ainda que barrigas famintas gritem
*
a METÁFORA é a lógica da ilógica
a poesia é a anti-matemática
ESSE
Sou Elymanôlo
Tupiafroeuropeu
Minha terra tem pindó
Gosto de sabiá
* * * * * * * * * *
Kafica
Se o artista da fome
tivesse ficado pelado
talvez não morresse de fome
A vida é uma vontade
A morte é um desejo
VOU
para Benfica
Pois lá, o morto não morre
O sino bate mais forte
E o rei não quis saber da coroa
________________
DEUS É DARWIN
BUSH É BOSTA
______________
um bairro em 90 graus
Benfica cresce num ângulo de 90 graus
Formado entre um córrego, o Três Pontes
E o Rio Paraibuna
Benfica é simples e operária
Cinza e triste
O sino da Matriz anuncia o padre
A luz da vela acende a Capela
As beatas tratam do terço
O padre do sétimo dia
Na praça Jeremias Garcia
A história celebra o tempo
Ruas se enchem de saudade
Casas minam lágrimas
* * * * * * * * * * * * * * * * * * *
O bicho morre
o homem é surreal
--------------------------------------------------------------------------------
Há mais dialética nos dedos dos mais simples
que em todas as mãos das filosofias neuróticas
--------------------------------------------------------------------------------
para Álvarez de Azevedo
- O menino galopava nu cavalgando em versos
Via as meninas como quem vê lírios no campo
(nunca ousou arrancá-las)
Simplesmente, quando caía as beijava
Mas sua boca nunca as tocava
Era triste em ser feliz em sonhos!
--------------------------------------------------------------------------------
O MITO DE IARA
um poema brega... inspirado na beleza épica de Jandira de Murilo (o gênio anti-imperialista)
E Disse Deus:
- Que seja Iara a mais bela das criações!
(E o sorriso de Iara abriu junto ao sol)
A poesia nasce aí nessa criação de Deus
Nessa poesia de carência que é a fé das pessoas
Por isso, digo que, as santas rezam nos lábios de Iara
O primeiro poema do mundo só tinha uma palavra
Iara. O poeta que adivinhou ficou cego de um olho
Ao ver a boca bendita de Iara
E viu que o mundo girava pela nudez de Iara
Os rios correram dos olhos de Iara
E um leão suicidou para aquecer Iara
- Os céus choraram diria Pablo Neruda
Ao primeiro choro de desespero de Iara
Pois é, a chuva também nasceu aí
Nos olhos da tal índia Iara
A vida criada entrou em mutação
Vieram novas espécies
E tudo porque Iara passava
Iara brincava quando os pássaros ainda eram mudos
Iara não acredita em Deus
Foi aí que a fé criou as sete notas
Porque assim Iara poderia dançar.
O cacique mandou caçar uma onça
Especialmente para esconder a nudez de Iara
Iara foi prometida ao guerreiro que fisgasse a pintada
E eles foram pra rede
O índio penetrava lentamente em Iara
Nasceram dois indiozinhos do ventre da índia
Daí os portugueses chegaram
E Iara foi ofertada ao colonizador
Os portugueses brigaram por causa de Iara
Aí começou a nascer gente
Não eram índios nem portugueses
Apenas brasilíndios em busca de si
Iara continuava mais bela
E a morte deixava de ser morte
O colonizador matava
E botavam a culpa em Iara
Porque por causa de Iara se podia matar
E matavam mesmo
Tudo pelo mito de Iara
E o tal Deus resolveu levá-la
O planeta estacionou no nada
Quando Iara tombou por bala
Enforcaram o colonizador
A fúria dos filhos de Iara
Era o ódio dos rebelados
Mas diziam que foi por causa de Iara
Para breganejar mais
Digo que as ovelhas ficaram nuas
Para aquecer a morte de Iara
Iara morta era doce
Dizem por aí que lá no céu
Jesus Cristo o mais virgem dos homens
Foi proibido de julgar Iara.
* * *
O TEMPO RASGA O QUE FOI VIDA
FEITO O VENTO DESMANCHANDO FLORES
O ESPAÇO É VITIMA DAS HORAS
OS MINUTOS APONTAM NA MINHA CARA
* *
Abro a janela.
O caos acelera no horizonte
Feito um carro que desce correndo
pela Olegário Maciel
Papai Noel agora mendiga na esquina
Pobre, barbudo e sujo
A realidade vadia no espaço
Urge-nos o momento,
A vida é o hoje
Somos nós o tempo, a morte e os nosso mortos.
**
Orkutianas!
Declaro
Faço poesia como um pescador que ama
Tão atarefado na transa do peixe
" Poetar é coisa de vagabundo"
As mães alertam: verso enche barriga?
Aí a gente tenta se encontrar numa profissão
Numa ótica da sociedade de tantas classes
Tantas.
E a vida passa como uma foiçada no canavial
Um dente a menos
A constate procura de amor
Subterfúgios para pecar
E deuses para desobedecer
Pinta os primeiros cabelos brancos
Daí a gente imagina
Que no fundo todo mundo é artista
Somos obras de arte
- Artesãos dentro de nós mesmos
Escrever talvez seja por isso
É minha maneira de sentir artista
Um artesão das palavras
888888888888888888888888888888888888888888888888
Rasgar ceda
Pode ser com s ou com c
Com c é até mais correto
Pensando bem
No verbo ceder
* * *
AMOR EM TUDO
O amor é a esperança
(budylééér)
O polém do porvir
(kastualvys)
O amor é vida no início verde
É filosofia de eterno
O amor não pode ter veneno
O amor é tudo
Sem amor não há revolução
Quem ama luta
O amor é amor ou não é nada
--------------------------------------------------------------------------------
ÁGUA
A água é verde
O lixo não
A água é a vulva
O lixo é o ânus
A vereda é água
O esgoto é burguesia que caga.
+ + + + + + + + + + + + + +
O tropeiro sobe o rio
Assobia-lhe a floresta
O silêncio cavalgado
Vai rompendo a ferradura
Boi-bumbá a noite é alta
Boi-bumbá tambor batendo
Boi-bumbá da multidão
No lombo sereno fino
Acendi uma fogueira
Boi-bumbá meu coração
Noite a dentro o dia inteiro
Boi-bumbá amor no peito
Vou bumbar lá no sertão.
***
OUTRO-RETRATO
Na vaidade que nada salva
Meus sapatos sempre estiveram suados
Tão por Minas e também das gerais
Urbano, da roça e jaz mestre de cerimônia
Com gosto pela terra e prego enferrujado
um burro tocando gaita
Guardião de muitos segredos
Igrejas e terreiros de macumba
Poeta com o jornalismo
Repórter medíocre de versos passárgados
Pobre na trilha do destino
Sagaz pelo espaço infinito
E inimigo mortal do tempo.
A MÁQUINA DE MOER
Enquanto uns assistem futebol
Outros lêem poesia
Uns gostam de Oswald de Andrade
Outros do tio Sam
Eu! Encho a cara de vinho
No Brasil, os portugueses tiveram muitos escravos
Quando eles estavam presos
O índio geralmente adoecia
O negro se masturbava e inventava feijoada
A senzala recriou um Brasil
O da imaginação!
O Brasil da imaginação!
* * * *
O amor ninguém sabe
Se soubesse não seria amor
O amor é o sentido e não o significado
O direito ninguém sabe
Se soubesse não seria amor
O sentido não tem significância
O amor escrito não é amor
Os poetas mentem!
---
Tenho escrito como um camelo no Saara.
Não bebo porque a madrugada os bares fecham.
Não amo porque na vida não encontro meu eu.
Em não aprender amar as diferenças,
Sou indiferente e deserto como um camelo.
Tenho cantado como uma lavadeira no gueto.
Não durmo porque as idéias os sonos desmaiam.
Não danço porque na morte não me encontro feliz.
Em não aceitar o fim,
Sou um assecla na inconstância de não crer em nada.
--------------------------------------------------------------------------------
Van
Derley
Tomaz
Dormevilly Nóbrega
O leão do Norte
ELOGIO À MADRUGADA
Sem poesia
A vida marcha picada
A fresta é sem luz
O sabiá não se escuta
O dia não é vida
A noite não é fábula
Com poesia
A tarde se curva sépia
O crepúsculo convida à imaginação
A poesia freqüenta a floresta
O saci traz o tabaco
o verso recorta a fábula
A poesia é uma utopia
A hipérbole do artesão.
* * * * * * * * * * * * * * * * * * *
ARTE É
ARTESANATO
detesto a iNDUSTRIOLÓGICa
das coisas toscas!
utopia
antes que triste e sem nada
as pessoas precisam sonhar
elas têm que acreditar em alguma coisa transformadora
encarar melhor as mudanças
nós mesmos somos produtos de um instinto de fome
Fome de si e fome de carne
Fome de arte
No mínimo.