sexta-feira, 19 de agosto de 2011

VELHOS POEMAS

Alguns dos meus poemas mais marginais. Aliás, esta é a minha verdadeira estética poética, se é que devo me situar em algum dos ismos paranóicos.
Um artesanato digital para os meus amigos guardarem dentro.
Sei que a poesia panfletária diminui a “qualidade” do verso. Dane-se. Nunca foi meu objetivo fazer poesia de presépio.

Boa viagem




nOvO
Enquanto o mundo dorme
Meu sono está desmaiado dentro de mim
E sonha tanto na sua hiper-atividade
Que se esqueceu de vir me buscar


Há várias noites estou na estação
Cochilando e sem destino
Com uma sede adicta e vacilante



Na favela, na falta de miragem
Os meninos se vestem de Lampião
Ou então, seguem os beatos ladrões de suas ofertas
E eu não durmo talvez por isso



Não estou bem da cachola
Tem uma tarja preta no criado-mudo
Louca para exterminar com minhas olheiras
Tento evitar mas preciso dormir esta noite



Estou precisando de uma cama nova
Roupas novas
E uma cara nova na minha fuça
Uma revolução na minha vida
Estou farto de gerúndios e de Palácios



Quero bicho-de-pé pra coçar a noite
E comida defumada em fogão à lenha
Estou farto de porteiro, cartões e virtualidade
De fax, formulários e canetadas



Estou com o saco estourando
No meu peito sinto o peso do meu corpo
Tarja preta na idéia e descanso no coração.



O cinema é uma

rosa desconstituindo-se
por detrás do pingüim.
No congelador uma cena do Rei-Momo
passando fome. Na sala acontece um velório
em que a mulata samba ao lado do morto.
A beata senta com desprendimento no colo do padre.


***







Para:Henrique Lott, Lúcio Rodrigues, Carlos Thaga, Danunzio e Marcos Vilela.



É belo o momento em que Jesus Cristo transformou a água em vinho. Um litro deste foi bebido por Charles Darwin (o épico cientista da evolução). Ele classificou ainda mais o poema de Adão : Eva! Uma macaca tesuda fazendo gente às frestas do sol. O artista é este fogo, a beleza, a magia e o vinho. É a loucura da loucura encarnada. O artista é a poesia vestida de matéria.




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· MARCINHO VP



morto

matado

do morro

o empregador de cangaceiro

marcinho vp

mais um lampião

apagado






a casa era de lona

não tinha muro

era um barracão

mas tinha pai, mãe e irmão

a casa não tinha jardim

mas não faltava flor






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Dentro grita o solado gasto
A lembrança dos passos que ficaram
O túmulo 61 do cemitério da Barreira do Triunfo
A casa de muitos dos meus
O endereço definitivo da minha linhagem








CHAGA IN-CONCRET


de clamar
de cisão
de pressão
de ferimento
de cifrar
de mente
de caído




JUIZ DE FORA
Princesa de nada
Cidade do dentro

No Morro do Imperador
Um Cristo celular

O rio profanado cor de graúna


Uma cidade linda
nas photografias do passado
Em sua saudosa rua da Direita


* * *



Quando o sabiá na gaiola canta
É só ele o canto não está ali o pássaro
Falta o essencial
A laranjeira, o palco do gorjeio

* * *


A maconha é a ponte da tristeza
Uma camisa de força nos injustiçados
O barato alienante do esquecimento
Ainda que barrigas famintas gritem


*





a METÁFORA é a lógica da ilógica

a poesia é a anti-matemática









ESSE



Sou Elymanôlo

Tupiafroeuropeu

Minha terra tem pindó

Gosto de sabiá



* * * * * * * * * *



Kafica



Se o artista da fome

tivesse ficado pelado

talvez não morresse de fome

A vida é uma vontade

A morte é um desejo





VOU



para Benfica

Pois lá, o morto não morre

O sino bate mais forte

E o rei não quis saber da coroa







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DEUS É DARWIN

BUSH É BOSTA

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um bairro em 90 graus


Benfica cresce num ângulo de 90 graus

Formado entre um córrego, o Três Pontes

E o Rio Paraibuna



Benfica é simples e operária

Cinza e triste



O sino da Matriz anuncia o padre

A luz da vela acende a Capela

As beatas tratam do terço

O padre do sétimo dia



Na praça Jeremias Garcia

A história celebra o tempo



Ruas se enchem de saudade

Casas minam lágrimas





* * * * * * * * * * * * * * * * * * *

O bicho morre

o homem é surreal






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Há mais dialética nos dedos dos mais simples

que em todas as mãos das filosofias neuróticas




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para Álvarez de Azevedo

- O menino galopava nu cavalgando em versos

Via as meninas como quem vê lírios no campo

(nunca ousou arrancá-las)

Simplesmente, quando caía as beijava

Mas sua boca nunca as tocava

Era triste em ser feliz em sonhos!


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O MITO DE IARA
um poema brega... inspirado na beleza épica de Jandira de Murilo (o gênio anti-imperialista)




E Disse Deus:

- Que seja Iara a mais bela das criações!

(E o sorriso de Iara abriu junto ao sol)

A poesia nasce aí nessa criação de Deus

Nessa poesia de carência que é a fé das pessoas

Por isso, digo que, as santas rezam nos lábios de Iara

O primeiro poema do mundo só tinha uma palavra

Iara. O poeta que adivinhou ficou cego de um olho

Ao ver a boca bendita de Iara



E viu que o mundo girava pela nudez de Iara

Os rios correram dos olhos de Iara

E um leão suicidou para aquecer Iara

- Os céus choraram diria Pablo Neruda

Ao primeiro choro de desespero de Iara

Pois é, a chuva também nasceu aí

Nos olhos da tal índia Iara



A vida criada entrou em mutação

Vieram novas espécies

E tudo porque Iara passava



Iara brincava quando os pássaros ainda eram mudos

Iara não acredita em Deus

Foi aí que a fé criou as sete notas

Porque assim Iara poderia dançar.



O cacique mandou caçar uma onça

Especialmente para esconder a nudez de Iara

Iara foi prometida ao guerreiro que fisgasse a pintada



E eles foram pra rede

O índio penetrava lentamente em Iara

Nasceram dois indiozinhos do ventre da índia



Daí os portugueses chegaram

E Iara foi ofertada ao colonizador

Os portugueses brigaram por causa de Iara

Aí começou a nascer gente

Não eram índios nem portugueses

Apenas brasilíndios em busca de si



Iara continuava mais bela

E a morte deixava de ser morte

O colonizador matava

E botavam a culpa em Iara

Porque por causa de Iara se podia matar

E matavam mesmo

Tudo pelo mito de Iara



E o tal Deus resolveu levá-la

O planeta estacionou no nada

Quando Iara tombou por bala

Enforcaram o colonizador



A fúria dos filhos de Iara

Era o ódio dos rebelados

Mas diziam que foi por causa de Iara



Para breganejar mais

Digo que as ovelhas ficaram nuas

Para aquecer a morte de Iara

Iara morta era doce



Dizem por aí que lá no céu

Jesus Cristo o mais virgem dos homens

Foi proibido de julgar Iara.

* * *





O TEMPO RASGA O QUE FOI VIDA



FEITO O VENTO DESMANCHANDO FLORES



O ESPAÇO É VITIMA DAS HORAS



OS MINUTOS APONTAM NA MINHA CARA





* *



Abro a janela.

O caos acelera no horizonte

Feito um carro que desce correndo

pela Olegário Maciel



Papai Noel agora mendiga na esquina

Pobre, barbudo e sujo

A realidade vadia no espaço

Urge-nos o momento,

A vida é o hoje

Somos nós o tempo, a morte e os nosso mortos.





**

Orkutianas!



Declaro

Faço poesia como um pescador que ama
Tão atarefado na transa do peixe



" Poetar é coisa de vagabundo"

As mães alertam: verso enche barriga?
Aí a gente tenta se encontrar numa profissão
Numa ótica da sociedade de tantas classes
Tantas.



E a vida passa como uma foiçada no canavial
Um dente a menos
A constate procura de amor
Subterfúgios para pecar
E deuses para desobedecer

Pinta os primeiros cabelos brancos



Daí a gente imagina

Que no fundo todo mundo é artista
Somos obras de arte
- Artesãos dentro de nós mesmos



Escrever talvez seja por isso
É minha maneira de sentir artista
Um artesão das palavras



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Rasgar ceda
Pode ser com s ou com c
Com c é até mais correto
Pensando bem
No verbo ceder








* * *





AMOR EM TUDO



O amor é a esperança

(budylééér)

O polém do porvir

(kastualvys)

O amor é vida no início verde

É filosofia de eterno



O amor não pode ter veneno

O amor é tudo

Sem amor não há revolução

Quem ama luta

O amor é amor ou não é nada






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ÁGUA



A água é verde

O lixo não



A água é a vulva

O lixo é o ânus



A vereda é água

O esgoto é burguesia que caga.





+ + + + + + + + + + + + + +



O tropeiro sobe o rio
Assobia-lhe a floresta
O silêncio cavalgado
Vai rompendo a ferradura

Boi-bumbá a noite é alta
Boi-bumbá tambor batendo
Boi-bumbá da multidão

No lombo sereno fino
Acendi uma fogueira
Boi-bumbá meu coração

Noite a dentro o dia inteiro
Boi-bumbá amor no peito
Vou bumbar lá no sertão.



***


OUTRO-RETRATO


Na vaidade que nada salva
Meus sapatos sempre estiveram suados
Tão por Minas e também das gerais
Urbano, da roça e jaz mestre de cerimônia

Com gosto pela terra e prego enferrujado
um burro tocando gaita

Guardião de muitos segredos
Igrejas e terreiros de macumba
Poeta com o jornalismo
Repórter medíocre de versos passárgados

Pobre na trilha do destino
Sagaz pelo espaço infinito
E inimigo mortal do tempo.




A MÁQUINA DE MOER

Enquanto uns assistem futebol
Outros lêem poesia
Uns gostam de Oswald de Andrade
Outros do tio Sam
Eu! Encho a cara de vinho

No Brasil, os portugueses tiveram muitos escravos
Quando eles estavam presos
O índio geralmente adoecia

O negro se masturbava e inventava feijoada
A senzala recriou um Brasil
O da imaginação!

O Brasil da imaginação!

* * * *

O amor ninguém sabe
Se soubesse não seria amor
O amor é o sentido e não o significado
O direito ninguém sabe
Se soubesse não seria amor
O sentido não tem significância
O amor escrito não é amor
Os poetas mentem!

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Tenho escrito como um camelo no Saara.
Não bebo porque a madrugada os bares fecham.
Não amo porque na vida não encontro meu eu.
Em não aprender amar as diferenças,
Sou indiferente e deserto como um camelo.
Tenho cantado como uma lavadeira no gueto.
Não durmo porque as idéias os sonos desmaiam.
Não danço porque na morte não me encontro feliz.
Em não aceitar o fim,
Sou um assecla na inconstância de não crer em nada.







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Van
Derley
Tomaz
Dormevilly Nóbrega

O leão do Norte








ELOGIO À MADRUGADA



Sem poesia

A vida marcha picada

A fresta é sem luz

O sabiá não se escuta

O dia não é vida

A noite não é fábula



Com poesia

A tarde se curva sépia

O crepúsculo convida à imaginação



A poesia freqüenta a floresta

O saci traz o tabaco

o verso recorta a fábula



A poesia é uma utopia

A hipérbole do artesão.



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ARTE É

ARTESANATO

detesto a iNDUSTRIOLÓGICa

das coisas toscas!







utopia



antes que triste e sem nada

as pessoas precisam sonhar

elas têm que acreditar em alguma coisa transformadora

encarar melhor as mudanças



nós mesmos somos produtos de um instinto de fome

Fome de si e fome de carne

Fome de arte

No mínimo.